De símbolos de status a experiências exclusivas: o novo comportamento dos consumidores de alta renda redefine o mercado do luxo
O conceito de luxo está passando por uma transformação profunda. Se antes a riqueza era exibida por meio de posses — bolsas de grife, relógios caros ou carros exclusivos —, agora ela se expressa por acesso, experiências e pertencimento. Dados de consultorias e análises de mercado mostram que indivíduos de alta renda estão trocando os guarda-roupas por passagens aéreas, canalizando seus gastos para viagens e experiências premium ao redor do mundo.
Em meio à incerteza global, o luxo deixou de ser uma questão de propriedade e tornou-se uma promessa de vivência e significado. Ainda que a demanda por moda e acessórios de grife esteja em queda, as despesas com viagens exclusivas, hospedagens de alto padrão e experiências personalizadas seguem crescendo de forma consistente em todo o planeta.
1. Queda no consumo de bens pessoais, ascensão das experiências
De acordo com relatórios da Bain & Company e da McKinsey, o setor de luxo está se dividindo em dois caminhos distintos. A Bain prevê uma redução de 2% a 5% nas vendas globais de bens pessoais de luxo em 2025, reflexo da cautela dos consumidores e do menor interesse pelo consumo ostensivo.
Em sentido oposto, a McKinsey estima que o mercado de hospedagem de luxo deve ultrapassar US$ 390 bilhões até 2028, frente aos US$ 240 bilhões registrados em 2023. O dado reforça uma tendência: os consumidores ricos buscam autenticidade e status simbólico, mais do que o acúmulo de bens.
2. Exclusividade: o novo motor do luxo
Enquanto o varejo de luxo desacelera, o setor de viagens se beneficia de um desejo pós-pandemia por liberdade e experiências transformadoras. Segundo o The Economist, hotéis como o Brown’s, em Londres — onde diárias ultrapassam seis mil libras (US$ 8,1 mil) —, continuam lotados mesmo em tempos de incerteza econômica.
A publicação descreve lobbies cheios e coquetéis luxuosos como prova de que os viajantes endinheirados continuam dispostos a investir em conforto, exclusividade e diferenciação.
“O mercado de luxo está passando por uma mudança estrutural”, aponta o relatório, observando que o número de consumidores de alta renda adquirindo produtos de grife diminuiu, enquanto as reservas em hotéis cinco estrelas, jatos particulares e viagens sob medida disparam.
A CoStar indica que, em 2025, a receita por quarto disponível em hotéis de luxo superou todos os outros segmentos durante todos os meses do ano. Já a Chase Travel, do JPMorgan Chase, registrou um aumento de mais de 20% nas passagens de primeira classe e executiva entre junho e agosto de 2025.
No transporte privado, a consultoria aeronáutica IBA prevê a entrega de 820 jatos particulares neste ano, um crescimento de 7,3% sobre 2024 — evidência de que o investimento em aviação exclusiva segue em alta.
3. Marcas de luxo invadem a hotelaria e o turismo
De olho nesse novo perfil de consumidor, as grifes de moda e joalheria estão migrando para o setor de hospitalidade. Bvlgari e Armani já administram seus próprios hotéis, enquanto o grupo LVMH — dono da Louis Vuitton e Fendi — expandiu sua presença com o trem de luxo Belmond no Reino Unido.
A gigante francesa também firmou parceria com a Accor para lançar o iate Orient Express, de 230 metros e 54 suítes, previsto para estrear em 2026, partindo da França. Dolce & Gabbana e Burberry seguiram o mesmo caminho, unindo-se a redes de resorts para criar clubes de praia e boutiques temporárias voltadas a viajantes de altíssimo poder aquisitivo.
O CEO do Grupo Accor, Sébastien Bazin, revelou o objetivo de elevar a fatia de receita proveniente do portfólio de luxo de 35% para 50% até 2030. Dono de marcas como Sofitel, Fairmont e Raffles, Bazin afirma que o luxo é hoje um dos pilares estratégicos do grupo.
“Os hóspedes buscam significado e conexão”, explicou. “Eles querem estadas memoráveis que vão além da hospedagem.”
4. O risco da massificação do luxo
Analistas destacam que parte dessa transformação tem origem nas novas formas de status social. O especialista Richard Clarke, da Bernstein, observa que roupas e bolsas de luxo tornaram-se acessíveis à classe média alta, perdendo seu caráter exclusivo.
Por outro lado, experiências únicas, como um safári particular ou uma expedição à Antártida, continuam sendo símbolos de distinção. As redes sociais amplificam esse fenômeno, tornando as viagens de luxo novos marcadores de status.
Entretanto, o crescimento acelerado do setor também traz riscos. A Bain & Company alerta que, à medida que hotéis de luxo se expandem para atender clientes “aspiracionais”, há o perigo de diluição da exclusividade.
Segundo a CoStar, a oferta global de quartos de luxo deve saltar de 1,8 milhão para quase 2,2 milhões até 2030, superando outros segmentos. Em Londres, a Savills projeta 18.750 quartos de luxo existentes e mais 1.618 em construção, com novas unidades das marcas Rosewood, Six Senses e Auberge.
As tendências de preço também seguem o padrão da moda: tarifas em alta. Embora a taxa de ocupação tenha ficado ligeiramente abaixo da de 2024, as diárias mais elevadas sustentaram o crescimento da receita. Especialistas alertam, no entanto, que aumentos contínuos podem minar a fidelização, caso os viajantes passem a questionar o valor real da experiência.
O segredo da longevidade das marcas de luxo
Entre as referências mais respeitadas está a Hermès, frequentemente citada como exemplo de equilíbrio entre exclusividade e crescimento sustentável. A grife francesa, ainda controlada pela família fundadora, mantém produção limitada, aumentos moderados e rigorosos padrões de qualidade, o que reforça seu prestígio atemporal.
Na hotelaria, grupos como o Rocco Forte Hotels seguem lógica semelhante. A rede boutique familiar opera apenas 15 propriedades e aposta no atendimento personalizado como diferencial. No Brown’s Hotel, sua unidade mais emblemática, os hóspedes são chamados pelo nome — um gesto simples que cria intimidade e senso de pertencimento.
“O toque pessoal pode ser a resposta em um momento em que muitos se perguntam o que o luxo realmente significa”, concluiu o The Economist.
Em um mercado em constante mutação, as marcas que conseguirem equilibrar expansão e exclusividade tendem a dominar a próxima fase do turismo e das viagens de alto padrão.
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